domingo, 20 de maio de 2007

Procedimentos Cautelares

Medidas provisórias e conservatórias

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1. Quais são os diferentes tipos de medidas?
Integram a categoria referida os chamados procedimentos cautelares, ou seja, os meios processuais «necessários para acautelar o efeito útil da acção» − art. 2.º, n.º 2, do Código de Processo Civil português. Tais procedimentos correspondem a conjuntos de actos praticados perante e por um tribunal com vista a garantir que a decisão a proferir em determinada acção se possa concretizar mantendo a sua eficácia e assumindo, em consequência, integral utilidade prática para quem a tenha instaurado e obtido ganho de causa.
Estes meios de tutela prévia são despoletados pela mera aparência de existência do direito invocado ou a invocar em juízo e pela antevisão do perigo de lesão desse direito. Assentam numa demonstração sumária e em juízos de probabilidade ou verosimilhança. Visam prevenir lesões irreparáveis através do afastamento do risco emergente da demora da decisão final, isto é, da alteração de circunstâncias essenciais potencialmente decorrente desse desfasamento temporal.
Estas medidas podem assumir finalidades conservatórias ou antecipatórias, o que significa que poderão ter como objectivo manter inalterada uma determinada situação, para que a sentença da acção principal não surja deslocada da realidade e desprovida da possibilidade de ser executada (como ocorre, por exemplo, quando se pretenda evitar a dissipação ou o extravio de bens sobre os quais possa vir a recair uma execução futura), ou antecipar a decisão do litígio enquanto não se obtém a sentença definitiva (como acontece quando se atribua uma prestação pecuniária provisória destinada a garantir o sustento, a habitação e o vestuário do requerente de prestação alimentar).
Os procedimentos cautelares podem ser: a) não especificados ou b) especificados.
Os primeiros são aqueles que não estão submetidos a qualquer modelo processual pré-definido, cabendo ao tribunal adoptar a medida adequada «a assegurar a efectividade do direito ameaçado» − n.º 1 do art. 381.º do código invocado. Tais procedimentos assentam em regras de tramitação comuns que são, aliás, subsidiariamente aplicáveis aos procedimentos nominados.
Os segundos obedecem a um figurino previamente enunciado na lei adjectiva e estão sujeitos a um quadro de requisitos, pressupostos e conteúdo decisório específicos.
São os seguintes os procedimentos cautelares especificados previstos no ordenamento jurídico civil português: a) Restituição provisória de posse; b) Suspensão de deliberações sociais; c) Alimentos provisórios; d) Arbitramento de reparação provisória; e) Arresto; f) Embargo de obra nova; g) Arrolamento.
A providência cautelar de restituição provisória de posse é utilizável quando o possuidor de certo bem tenha sido dele despojado contra a sua vontade, através de coação física ou moral, e pretenda ser provisoriamente restituído à sua posse.
O procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais está à disposição dos sócios das associações ou sociedades, seja qual for a sua espécie, que pretendam obter a suspensão da execução de deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, susceptíveis de gerarem «dano apreciável» − art. 396.º do Código de Processo Civil.
A providência de alimentos provisórios viabiliza o recebimento de uma quantia mensal destinada a garantir, até ao pagamento da primeira prestação definitiva, a disponibilidade dos recursos estritamente necessários ao custeio das despesas relativas ao sustento, habitação e vestuário do requerente, bem como os dispêndios da acção quando este não possa beneficiar de apoio judiciário.
A providência cautelar de arbitramento de reparação provisória faculta aos lesados e aos terceiros com direito a indemnização ou a alimentos que, por conexão com uma acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal e face à existência de uma situação de necessidade ou «susceptível de pôr seriamente em causa o seu sustento ou habitação do lesado», peticionem a atribuição de uma determinada quantia pecuniária, sob a forma de renda mensal, a título de «reparação provisória do dano» − n.º 1 do art. 403.º do mesmo Código.
O procedimento de arresto permite ao «credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito» obter a «apreensão judicial de bens» − art. 406.º do referido Código de Processo Civil.
Fazendo uso da providência de embargo de obra nova, quem se julgue «ofendido no seu direito de propriedade, singular ou comum, em qualquer outro direito real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo, pode requerer (…) que a obra, trabalho ou serviço seja mandado suspender imediatamente» − n.º 1 do art. 412.º do referenciado Código. Este embargo pode ser também feito por via extrajudicial, desde que ocorra a posterior ratificação judicial. Esta deve ser requerida no prazo de cinco dias.
O procedimento cautelar de arrolamento deve ser instaurado face à existência de «justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos», com vista à obtenção da descrição desses bens em auto judicial (com menção do respectivo valor, atribuído por um perito − «louvado»), e à entrega dos mesmos a um depositário − art. 421.º e 424.º do Código de Processo Civil.

2. Quais são as condições sob as quais essas medidas podem ser ordenadas?
Veja-se, quanto a esta questão, o respondido no âmbito da pergunta anterior.
2.1. Descrição do procedimento
É sempre necessário pedir ao tribunal que autorize a medida?
Com excepção da providência cautelar de embargo de obra nova, no seio do qual é possível assumir uma iniciativa prévia de natureza extrajudicial seguida de um pedido de ratificação judicial, todos os demais procedimentos assentam num requerimento inicial dirigido ao tribunal.
Qual é o tribunal competente para ordenar estas medidas?
É competente para ordenar tais medidas o tribunal judicial definido de acordo com os seguintes critérios, enunciados no art. 83.º do Código ao qual se vem fazendo referência:
a) «O arresto e o arrolamento tanto podem ser requeridos no tribunal onde deva ser proposta a acção respectiva» (ou seja, a acção em que se discuta em termos definitivos o direito que pela providência se pretende acautelar), «como no do lugar onde os bens se encontrem ou, se houver bens em várias comarcas, no de qualquer destas»;
b) «Para o embargo de obra nova é competente o tribunal do lugar da obra»;
c) «Para os outros procedimentos cautelares é competente o tribunal em que deva ser proposta a acção respectiva».
É obrigatória a representação por um advogado?
A representação por advogado é obrigatória desde que o valor da providência seja superior a € 3 740,98 ou quando seja sempre admissível recurso.
O valor processual do procedimento determina-se em atenção aos seguintes critérios: a) «Nos alimentos provisórios e no arbitramento de reparação provisória, pela mensalidade pedida, multiplicada por doze»; b) «Na restituição provisória de posse, pelo valor da coisa esbulhada»; c) «Na suspensão de deliberações sociais, pela importância do dano»; d) «No embargo de obra nova e nas providências cautelares não especificadas, pelo prejuízo que se quer evitar»; e) «No arresto, pelo montante do crédito que se pretende garantir»; j) «No arrolamento, pelo valor dos bens arrolados» − art. 313.º do mesmo Código.
Qual é o papel dos intermediários, tais como agentes ou solicitadores de execução?
Em Portugal, desempenham as funções de agentes de execução os solicitadores de execução e os por oficiais de justiça. Tais agentes desempenham a sua actividade também nestas providências, ao nível da realização de citações e do cumprimento das decisões de arresto e arrolamento.
Qual a escala de custos de cada tipo de medida?
A taxa de justiça destas providências é paga num só momento, aquando da apresentação do requerimento inicial, e corresponde aos valores indicados na seguinte tabela:

Valor da providência
Taxa de Justiça de cada parte/conjunto de sujeitos processuais (UC)
Até € 500
0,5
De € 500,01 a € 1875
0,75
De € 1875,01 a € 3750
1
De € 3750,01 a € 7500
1,25
De € 7500,01 a € 15000
1,5
De € 15000,01 a € 25000
2
De € 25000,01 a € 40000
2,75
De € 40000,01 a € 70000
3,5
De € 70000,01 a € 100000
5
De € 100000,01 a € 135000
6,5
De € 135000,01 a € 170000
8
De € 170000,01 a € 210000
9,75
De € 210000,01 a € 250000
12

Para além de € 250 000, à taxa de justiça indicada acresce, por cada € 25 000 ou fracção, 2,5 UC.
A Unidade de Conta (UC) tem, no período 2004-2006, o valor de € 89.
Nos termos do disposto no art. 32.º do Código das Custas Judiciais, as custas compreendem, ainda, os seguintes encargos: a) Os reembolsos de despesas adiantadas; b) «Os pagamentos devidos ou adiantados a quaisquer entidades, nomeadamente documentos, pareceres, plantas, outros elementos de informação ou de prova e serviços que o tribunal tenha requisitado, excepto o custo de certidões extraídas oficiosamente pelo tribunal»; c) «As retribuições devidas a quem interveio acidentalmente no processo, incluindo as compensações legalmente estabelecidas»; d) «As despesas de transporte e ajudas de custo»; e) «O reembolso ao Estado do dispêndio com o apoio judiciário, incluindo, entre outros, o relativo a honorários pagos ou adiantados no âmbito do mesmo»; f) «O custo da citação por funcionário judicial no caso de o autor declarar pretendê-la».
2.2. Condições de fundo
Quais os critérios utilizados pelo tribunal para conceder uma medida?
Na avaliação dos requerimentos de decretamento de providência cautelar, o tribunal deve sempre ponderar o carácter fundado do receio invocado e a gravidade e difícil reparabilidade da potencial lesão do direito. Mais avaliará se a medida conservatória ou antecipatória se mostra, em concreto, apropriada para assegurar a permanência do direito alegadamente posto em risco. Deve atender à existência de perigo na demora.
Controlará, também, a relação de dependência efectiva ou potencial do procedimento com uma causa instaurada ou a instaurar que tenha por fundamento o direito precavido.
Cabe ao tribunal, neste tipo de procedimentos, colher uma demonstração sumária, ou seja, menos rigorosa que no âmbito da acção principal, da probabilidade séria da existência do direito a acautelar e do carácter suficientemente justificado do receio da sua lesão.
Quanto a outros requisitos a verificar também relativamente aos procedimentos cautelares especificados veja, por favor, a resposta à questão n.º 1.
«A providência pode, não obstante, ser recusada pelo tribunal, quando o prejuízo dela resultante para o requerido exceda consideravelmente o dano que com ela o requerente pretende evitar» − n.º 2 do art. 387.º do Código de Processo Civil.
Relativamente ao crédito: deverá estar-se perante um caso discutível?
O direito a proteger através da providência poderá ser já existente ou emergente de decisão a proferir, isto é, ainda sob discussão.
Relativamente ao devedor:
Existe um requisito de urgência?
A noção de urgência paira sobre todas as providências. É por tal razão que se lhes atribui «sempre carácter urgente, precedendo os respectivos actos qualquer outro serviço judicial não urgente» e se define que os «procedimentos instaurados perante o tribunal competente devem ser decididos, em 1ª instância, no prazo máximo de dois meses ou, se o requerido não tiver sido citado, de 15 dias» − art. 382.º do Código de Processo Civil.
Existe um requisito de demonstração de que a decisão não será executável em virtude da remoção ou desaparecimento dos bens do devedor?
É, efectivamente, assim no âmbito dos procedimentos conservatórios de arresto e arrolamento.

3. Objecto e natureza das medidas
3.1. Que tipos de bens podem ser objecto das medidas?
− Contas bancárias?
− Bens móveis?
− Meios de transporte registados?
− Bens imóveis?
− Outros?
Podem ser objecto de medidas cautelares quaisquer tipos de bens.
3.2. Quais são os efeitos destas medidas?
Porque emanadas de tribunais, estas medidas, «são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades», nos termos do disposto no n.º 2 do art. 205.º da Constituição da República Portuguesa.
Relativamente ao devedor que não cumpre a decisão:
É válido o acto de disposição dos seus bens?
Se, nas providências de arresto ou no arrolamento, o devedor for constituído depositário dos bens e os alienar comete um acto contrário à ordem pública. O negócio jurídico celebrado nesses termos será nulo se o fim de defraudar a providência decretada for comum às partes intervenientes nesse negócio, nos termos do disposto no art. 281.º do Código Civil português.
Está sujeito a sanções?
Sim. Está sujeito a sanção penal, a consequências de natureza civil, designadamente ao arresto de bens de valor correspondente ao dos que lhe tenham sido confiados e que não haja apresentado, adicionado do valor das custas e das despesas acrescidas, bem como à obrigação de indemnizar.
Face a terceiros:
Quais são as obrigações do Banco no que respeita à disponibilização de informações e à penhora das contas?
No procedimento cautelar de arresto, os Bancos devem, no prazo de 15 dias, «comunicar ao solicitador da execução o montante dos saldos existentes, ou a inexistência de conta ou saldo»; seguidamente, devem comunicar ao requerido o arresto efectuado. A instituição de crédito «é responsável pelos saldos bancários nela existentes à data da notificação e fornecerá ao tribunal extracto onde constem todas as operações que afectem os depósitos após a realização» do arresto − n.ºs 7 e 9 do art. 861.º-A, aplicável por força do disposto no n.º 2 do art. 406.º, ambos do referido Código de Processo Civil.
Quais são as sanções para o desrespeito da decisão?
A omissão da prestação de informação indicada na resposta anterior poderá gerar a fixação de multa processual. Da acção descrita poderá, ainda, emergir responsabilidade civil, ou seja, a obrigação de indemnizar.
3.3. Qual é a validade de tais medidas?
Existe uma validade limitada por um período de tempo definido por lei ou na decisão judicial?
Tais medidas têm uma validade temporalmente balizada, o que resulta das particulares do seu regime legal.
As medidas são válidas até ao julgamento ou até uma outra decisão?
As medidas são válidas até ao momento em que a decisão do processo principal do qual o procedimento esteja dependente possa produzir os seus efeitos. Por exemplo, nos alimentos provisórios e no arbitramento de reparação provisória, esse momento é o do pagamento da primeira prestação definitiva ou da indemnização fixada e, no arresto, o da conversão deste em penhora.
No caso de a decisão inicial ter sido proferida de forma unilateral, existe um prazo para organizar uma audição das partes?
Quando o requerido não tenha sido ouvido antes de a providência ser decretada, só é notificado da decisão que a ordenou após a sua concretização. Se pretender deduzir oposição, com vista a «alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução» (al. b) do n.º 1 do art. 388.º do Código de Processo Civil) deverá apresentar a sua oposição no prazo de dez dias contados da data da sua válida notificação.
Findo este prazo realiza-se, se necessário, diligência de produção «das provas requeridas ou oficiosamente determinadas pelo juiz» − n.º 1 do art. 386.º do mesmo Código.

4. É possível recorrer da medida?
É possível recorrer da medida imposta nos procedimentos de valor superior a € 3 740,98, desde que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor também superior a metade deste quantitativo e, independentemente de qualquer valor, se o recurso «tiver por fundamento a violação das regras de competência internacional, em razão da matéria ou da hierarquia ou a ofensa de caso julgado». «Também admitem sempre recurso as decisões (…) dos procedimentos cautelares, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre» − art. 678.º do Código ao qual se vem fazendo referência.
Das decisões proferidas nos procedimentos cautelares não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível.
Quem pode impugná-la?
Pode impugnar a decisão cautelar quem, sendo parte no procedimento, nele tenha ficado vencido, bem como as pessoas que, apesar de não serem partes, tenham sido por ela directa e efectivamente prejudicadas.
Qual o tribunal competente para apreciar o recurso?
O tribunal competente para apreciar o recurso é um tribunal de 2.ª instância do distrito judicial em que se situe o órgão jurisdicional que tenha proferido a decisão que se pretenda impugnar.
Qual o prazo de interposição do recurso?
O prazo de interposição do recurso é de 10 dias, contados da notificação da decisão.
Qual o efeito de tal recurso?
O recurso interposto do despacho que indefira liminarmente o requerimento inicial da providência ou que não a ordene tem efeito suspensivo, ou seja, suspende a eficácia da decisão recorrida.
Não suspende a decisão impugnada o recurso da decisão que decrete a providência.

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